sexta-feira, 4 de março de 2011

A história e sua escrita – as Praças Tahrir e Verde

Gabito. Hoje vou publicar um texto com uma breve reflexão sobre acontecimentos que estão acontecendo em países do Oriente Médio. Desde o começo de janeiro várias pessoas têm saído às ruas em seus países pedindo mudanças políticas, mudanças de políticos, mais crescimento econômico, mais direitos políticos, mais voz... Enfim, uma série de coisas, num desses momentos importantes para uma região e, nesses tempos-modernos-glotbalizados de 2011, têm eco e desdobramentos mundo afora. Enquanto falamos já caíram governos na Tunísia e no Egito, enquanto outros seguram-se em tronos ou em cadeiras presidenciais mesmo. Mundo afora não chegam só as notícias mas outros ecos de protestos tb inspirados nesse momento singular dos países árabes. Bom, mas vamos falar sobre a Itália, Israel e outros lugares num próximo texto. Agora vou publicar uma pequena reflexão que rascunhei sobre como a História acontece, como os eventos se sucedem e como o que se conta desses acontecimentos ajuda a construir essas consequências que chamamos mais uma vez de História. Interessante pensar nas consequências... elas se dão das mais variadas formas. Na História se dão pelas ações, pelas ruas e também pelas palavras. Bom, publico abaixo o que quis dizer. Beijo.

A História e a escrita da História têm sido produzidas simultaneamente e são momentos importantes para serem observadas nestas semanas em que se acompanham os protestos dos tunisianos, dos egípcios, dos líbios e de outras populações. Falo da História e da sua escrita porque é impossível dissociar as duas camadas e é vital pensar neste diálogo para se compreender a cena contemporânea. Este diálogo é sobretudo importante porque o que se conta da História, seja ela pensada no passado ou seja a história do tempo presente, tem efeitos sobre o próprio evento a respeito do qual se fala.

No caso do Egito, além de acompanhar dia-a-dia, tomamos conhecimento dos eventos que se sucederam em torno da Praça Tahrir por diferentes vozes, veículos, suportes e textos, da mesma forma como vamos vendo suceder as opiniões e os discursos a respeito do que se passa em Trípoli. Ajudou, por exemplo, a formar o cenário do Cairo em efervescência a repercussão a respeito da presença e da força da Irmandade Muçulmana nestes acontecimentos. O quanto esta organização, que em verdade foi uma das tantas forças presentes nas manifestações no Egito, foi vista como interlocutora principal dos manifestantes fez diferença no modo como a sociedade internacional e a mídia interpretaram o movimento.

É verdade que as ações históricas em si determinam o que se vai contar sobre elas. A força dos manifestantes no Egito não deixou possibilidades para que fossem ignoradas as reivindicações dos jovens egípcios ou que se chamasse de outro nome que não fosse “revolução” a sua permanência no Centro do Cairo. Mas o que se fala a respeito dos eventos históricos, seja através do discurso da imprensa, sejam as declarações oficiais de governos, seja o que corre no boca-a-boca nas mesas dos cafés, também determina em muito no que se transformarão esses fatos.

Por isso fala-se que é difícil prever o que acontece a seguir nesses levantes que parecem passar de país para país. Não é porque seria como fazer um exercício de futurologia. Mas porque o quebra-cabeças é complexo. Cada ato e cada fala desses atores produz efeitos concretos e discursos que alteram a realidade a seguir. No caso das manifestações no Egito alteraram de forma absurdamente rápida. Vimos a história ser feita em menos de 20 dias, com uma profusão de vozes, opiniões, falas, declarações e expectativas.

De todas as vozes, a mais importante e definidora é a dos jovens na Praça Tahrir, que fez discursos oficiais se inclinarem, no Oriente e no Ocidente, atores se posicionarem e governos de fato ruírem. Para a maioria dos analistas brasileiros, cujo país passou por anos de ditaduras militares, foi difícil prever que os manifestantes separariam o exército de Mubarak a ponto de, o forçando a cair, aceitassem que os militares, que o sustentaram por tanto tempo, conduzissem o processo a partir daquele momento. Mais uma vez a população egípcia produziu mais reorganização dos discursos. Essa experiência do Egito contribuiu sobremaneira para novas interpretações dos eventos seguintes como o que ainda acontece e surpreende na Líbia. Mas os atores e os discursos são muitos e variados, exigindo do crítico contemporâneo enorme atenção para compreender as falas e os desdobramentos na realidade, fazendo com que o exercício de falar do dia de amanhã seja mais que futurologia, mas resultado da compreensão plena de como se constrói dia após dia a cena contemporânea.

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