
A História e a escrita da História têm sido produzidas simultaneamente e são momentos importantes para serem observadas nestas semanas em que se acompanham os protestos dos tunisianos, dos egípcios, dos líbios e de outras populações. Falo da História e da sua escrita porque é impossível dissociar as duas camadas e é vital pensar neste diálogo para se compreender a cena contemporânea. Este diálogo é sobretudo importante porque o que se conta da História, seja ela pensada no passado ou seja a história do tempo presente, tem efeitos sobre o próprio evento a respeito do qual se fala.
No caso do Egito, além de acompanhar dia-a-dia, tomamos conhecimento dos eventos que se sucederam em torno da Praça Tahrir por diferentes vozes, veículos, suportes e textos, da mesma forma como vamos vendo suceder as opiniões e os discursos a respeito do que se passa em Trípoli. Ajudou, por exemplo, a formar o cenário do Cairo em efervescência a repercussão a respeito da presença e da força da Irmandade Muçulmana nestes acontecimentos. O quanto esta organização, que em verdade foi uma das tantas forças presentes nas manifestações no Egito, foi vista como interlocutora principal dos manifestantes fez diferença no modo como a sociedade internacional e a mídia interpretaram o movimento.
É verdade que as ações históricas em si determinam o que se vai contar sobre elas. A força dos manifestantes no Egito não deixou possibilidades para que fossem ignoradas as reivindicações dos jovens egípcios ou que se chamasse de outro nome que não fosse “revolução” a sua permanência no Centro do Cairo. Mas o que se fala a respeito dos eventos históricos, seja através do discurso da imprensa, sejam as declarações oficiais de governos, seja o que corre no boca-a-boca nas mesas dos cafés, também determina em muito no que se transformarão esses fatos.
Por isso fala-se que é difícil prever o que acontece a seguir nesses levantes que parecem passar de país para país. Não é porque seria como fazer um exercício de futurologia. Mas

De todas as vozes, a mais importante e definidora é a dos jovens na Praça Tahrir, que fez discursos oficiais se inclinarem, no Oriente e no Ocidente, atores se posicionarem e governos de fato ruírem. Para a maioria dos analistas brasileiros, cujo país passou por anos de ditaduras militares, foi difícil prever que os manifestantes separariam o exército de Mubarak a ponto de, o forçando a cair, aceitassem que os militares, que o sustentaram por tanto tempo, conduzissem o processo a partir daquele momento. Mais uma vez a população egípcia produziu mais reorganização dos discursos. Essa experiência do Egito contribuiu sobremaneira para novas interpretações dos eventos seguintes como o que ainda acontece e surpreende na Líbia. Mas os atores e os discursos são muitos e variados, exigindo do crítico contemporâneo enorme atenção para compreender as falas e os desdobramentos na realidade, fazendo com que o exercício de falar do dia de amanhã seja mais que futurologia, mas resultado da compreensão plena de como se constrói dia após dia a cena contemporânea.
Nenhum comentário:
Postar um comentário